O
DOSSIÊ
(Esta
é uma obra de FICÇÃO)
A história se passa em
Curralzinho do Grotão. Longe. Muito longe daqui; e talvez até nos felicitemos
por isso. Ano de eleições municipais, todo mundo conhece todo mundo, tapinhas
nas costas, botijas de gás, milheiros de lajota, sorrisos arreganhados e muitos
“amigos” aparecendo de todos os lados. E obras. Difícil não imaginar que a
cidade tenha sido invadida por uma turba ensandecida de tatus, tamanha a
quantidade de buracos. E placas, naturalmente.
De um lado da disputa,
Clepto H. Tuno, o atual prefeito, que naturalmente deseja permanecer como tal.
“Quatro anos é muito pouco tempo. Curralzinho precisa continuar crescendo!”. A
cidade só não anda mais limpa, como o povo veio pedindo nos últimos tempos
(três anos, mais ou menos), por conta da quantidade de poeira que a “patrola” e
a “reta”, compradas “zerinhas” com os recursos de um fundo desses quaisquer,
andam fazendo por aí. “Se eu não usar a máquina, eu não administro pro meu
povo!” – esbraveja o alcaide. “As máquinas, Quequé!” – Dona Tininha,
primeira-dama, sempre o corrigindo.
Quase empatado, Trajano de
S. Morais, ex-prefeito não sei quantas vezes, denunciando tudo e todos. Dizem
que colocou um cupincha para vasculhar até o lixo do prefeito, que não pode
tirar uma foto sem ser acusado de “fazer uso indevido da máquina”. Pensa numa
combinação de letras: MP, OAB, TRE... pode ir lá e procurar, que tem uma
denúncia do Trajano contra o Clepto. E, se procurar um pouquinho mais, vai
encontrar as do Clepto contra o Trajano, de uns 3, 4 anos atrás.
A imprensa local não é
contra nem a favor. Muito pelo contrário.
E tem o Doutor Justo, que
não é candidato a nada, mas uma espécie de conselheiro da cidade. Nobilíssimo
causídico aposentado, casado há 60 anos com Dona Izildinha, “e fidelíssimo”;
uma espécie de baluarte da ética e da moral na cidade e redondezas. Certa
feita, ao discursar na Assembleia Legislativa, afirmou ser um “bastião de
resistência conta a falta de transparência no serviço público” e foi difícil
convencer o presidente da Sessão de que não tinha nenhum Doutor Sebastião
ali...
Doutor Justo deu pra passar
horas trancafiado no seu gabinete, na frente de um computador, catando milho
por horas a fio. Até que sai de lá com aquela cara de quem traduziu “Os Lusíadas”,
brandindo um calhamaço volumoso de folhas impressas. Dona Izildinha espicha os olhos,
mas não pergunta; ele sempre fala, mesmo... E ele explica que se trata de um
dossiê, enumerando as falcatruas cometidas na Prefeitura, com dados
incontestáveis: “um documento que mudará para sempre os rumos políticos de
Curralzinho!”
Ela passa os olhos, mas não
consegue conter a observação: “Mas o local onde deveria estar o nome do acusado
está em branco...”.
- Sim. Eu deixei de
propósito. Vamos ver quem paga mais...
Ricardo Lemos é pai, filho,
escritor, músico amador, empresário, contribuinte, eleitor e, por fim, cidadão;
um filho de Deus, como você.
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