sábado, 24 de março de 2012

FILOSOFIA DE "BUTIQUIM" - O DOSSIÊ


O DOSSIÊ

(Esta é uma obra de FICÇÃO)

A história se passa em Curralzinho do Grotão. Longe. Muito longe daqui; e talvez até nos felicitemos por isso. Ano de eleições municipais, todo mundo conhece todo mundo, tapinhas nas costas, botijas de gás, milheiros de lajota, sorrisos arreganhados e muitos “amigos” aparecendo de todos os lados. E obras. Difícil não imaginar que a cidade tenha sido invadida por uma turba ensandecida de tatus, tamanha a quantidade de buracos. E placas, naturalmente.

De um lado da disputa, Clepto H. Tuno, o atual prefeito, que naturalmente deseja permanecer como tal. “Quatro anos é muito pouco tempo. Curralzinho precisa continuar crescendo!”. A cidade só não anda mais limpa, como o povo veio pedindo nos últimos tempos (três anos, mais ou menos), por conta da quantidade de poeira que a “patrola” e a “reta”, compradas “zerinhas” com os recursos de um fundo desses quaisquer, andam fazendo por aí. “Se eu não usar a máquina, eu não administro pro meu povo!” – esbraveja o alcaide. “As máquinas, Quequé!” – Dona Tininha, primeira-dama, sempre o corrigindo.

Quase empatado, Trajano de S. Morais, ex-prefeito não sei quantas vezes, denunciando tudo e todos. Dizem que colocou um cupincha para vasculhar até o lixo do prefeito, que não pode tirar uma foto sem ser acusado de “fazer uso indevido da máquina”. Pensa numa combinação de letras: MP, OAB, TRE... pode ir lá e procurar, que tem uma denúncia do Trajano contra o Clepto. E, se procurar um pouquinho mais, vai encontrar as do Clepto contra o Trajano, de uns 3, 4 anos atrás.

A imprensa local não é contra nem a favor. Muito pelo contrário.

E tem o Doutor Justo, que não é candidato a nada, mas uma espécie de conselheiro da cidade. Nobilíssimo causídico aposentado, casado há 60 anos com Dona Izildinha, “e fidelíssimo”; uma espécie de baluarte da ética e da moral na cidade e redondezas. Certa feita, ao discursar na Assembleia Legislativa, afirmou ser um “bastião de resistência conta a falta de transparência no serviço público” e foi difícil convencer o presidente da Sessão de que não tinha nenhum Doutor Sebastião ali...

Doutor Justo deu pra passar horas trancafiado no seu gabinete, na frente de um computador, catando milho por horas a fio. Até que sai de lá com aquela cara de quem traduziu “Os Lusíadas”, brandindo um calhamaço volumoso de folhas impressas. Dona Izildinha espicha os olhos, mas não pergunta; ele sempre fala, mesmo... E ele explica que se trata de um dossiê, enumerando as falcatruas cometidas na Prefeitura, com dados incontestáveis: “um documento que mudará para sempre os rumos políticos de Curralzinho!”

Ela passa os olhos, mas não consegue conter a observação: “Mas o local onde deveria estar o nome do acusado está em branco...”.

- Sim. Eu deixei de propósito. Vamos ver quem paga mais...

Ricardo Lemos é pai, filho, escritor, músico amador, empresário, contribuinte, eleitor e, por fim, cidadão; um filho de Deus, como você. 

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