quinta-feira, 5 de novembro de 2009

GENTE ASSIM



Dia desses, curtindo um desses raros momentos em que a vida nos empresta um nada de tempo pra matutar, enquanto a estrada passava pela janela do coletivo, arrastando consigo postes, árvores, casas e gentes de todo tipo, cerrei os olhos pra enxergar melhor e pus-me a imaginar de que tipo de gente eu gostava mais. Afinal de contas, gente é um bicho pra lá de complicado: tudo do mesmo gênero e espécie, mas cada um com sua mania de achar que é um universo em si.


A primeira imagem que me veio à mente foi do Super Homem. Aquele, vivido pelo Cristopher Reeve, nem sei quanto tempo faz, quando ainda existia Cine Broadway e tantas delícias mais. Tenho que confessar aqui, mas não contem pra ninguém, que foi a minha primeira visita ao cinema, e é claro que toda aquela aura de novidade influenciou sobremaneira a maneira como vi o filme e o quanto aquilo me afetaria por toda a vida.


É claro que eu queria ser como ele. Afinal de contas, vencer um cara como o Lex Luthor, salvar o mundo e ainda derrotar a morte (lembra daquela cena em que a Lois Lane é tragada com carro e tudo por uma enorme fenda no solo e o intrépido mocinho, sem pensar duas vezes, inverte o sentido de rotação do planeta inteiro, fazendo voltar o tempo e ressuscitando a mulher amada? Passei horas incontáveis e deliciosas dando as mais convincentes explicações científicas para o inusitado feito.) não era mesmo tarefa pra qualquer um. É claro que até hoje eu não consigo entender porque um cara que era super em tudo, inclusive na inteligência, insistia em usar a cueca por cima da calça. Nisso eu não queria ser como ele, embora talvez fosse o mais fácil de imitar.


Além de estar sempre pronto para salvar o mundo, atento a todo e qualquer pedido de socorro, ainda tinha que disfarçar-se de Clark Kent, dar conta de escrever para o jornal e tomar bronca do chefe sem jamais alterar a voz ou sequer pensar em vomitar aquela famigerada frase que tanta gente com muito menos mérito e condições usaria sem a menor sombra de hesitação: "você sabe com quem está falando?!" Em uma palavra, o genro dos sonhos de qualquer mãe zelosa.


Passou o tempo. Outros heróis vieram povoar meu imaginário; alguns (muito) poucos, ocuparam espaço na minha realidade. Mas o primeiro a gente nunca esquece.


Passou o tempo, como o tempo sempre passa. E não tem Super Homem ou botox que o faça regredir. Os super heróis ficaram pra trás.


Hoje nem o Super Homem é mais o mesmo. Foi promovido a Superman. (Nossos pequenos, desde muito cedo, são doutrinados a reconhecer que MAN é algo muito superior a qualquer homem. E capricham na pronúncia.) Mas continua lá, nos espiando do alto das nuvens, sempre pronto a atender todo e qualquer grito de "HELP".


Ligeiro, astuto e sempre penteado, é desse tipo de supergente que não hesita, nunca titubeia; tem sempre uma resposta pronta pra tudo, seja em sua mente invariavelmente brilhante, seja em seus sempre retesados músculos de aço. Nunca se deixa assolar pela dúvida. E o que é pior, nunca tem preguiça.


Pensando bem, acho que ele continua o mesmo.


Eu é que não gosto mais de gente assim.

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